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sexta-feira, 4 de março de 2022

VOCÊ SABE COM QUEM TÁ FALANDO?

Gosto muito da  jornalista Cora Ronai.

Amo os textos que ela escreve e a forma como conta os causus.

Este causo tem algum tempo mas é bom demais e pensei em dividir com você.

Vai que você ainda não leu e passa pelo mesmo constrangimento que a Cora.

Hora de sentir um alívio...rs



"Era um daqueles fins de tarde gloriosos que a gente acha que só existem no Rio, e eu estava na praia com as crianças, que ainda eram pequenas. Veio uma amiga, e conversamos um bocado antes que ela seguisse em frente.
-- Quem é ela? -- perguntou a Bia.
Tive que confessar que não fazia ideia. Bia voltou a brincar com o baldinho. Um amigo veio fazer um cafuné nela e no Paulinho e dar um alô. Conversamos, e a cena se repetiu:
-- E esse, quem é?
-- Não sei, meu bem. Eu sei que conheço, mas não lembro quem é.
E assim foi com mais algumas pessoas, até que a Bia interrompeu o novo interlocutor:
-- Quem é ela? -- perguntou, apontando para mim.
Ele achou a pergunta engraçada, e caprichou na resposta:
-- É a minha amiga Cora Rónai. Você ainda nem existia e eu já conhecia ela há muito tempo!
-- E ele quem é, mãe?
-- Ora, mas eu sou... -- começou o rapaz.
-- Não, você fica quieto! Eu quero que ela responda.
-- Ele é o meu amigo.
-- Mas como é o nome dele?
E eu, que quis cavar um buraco do tamanho do mundo na areia e sumir dentro dele, fui obrigada a dizer, mais uma vez, que não me lembrava. A praia acabou. O amigo foi embora acabrunhado, e a Bia veio ouvindo bronca durante todo o caminho para casa.
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Conheci o meu primeiro marido na orquestra juvenil do Teatro Municipal. Achei bonito o moço que sentava lá nos primeiros violinos, e fiquei torcendo para que, no próximo ensaio, ele viesse com a mesma camisa laranja, para que eu me lembrasse de quem era. A nossa vida talvez tivesse sido diferente se ele não tivesse repetido a camisa.
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Essas duas histórias resumem a aflição da minha vida: sou o que, antigamente, se chamava "péssima fisionomista", ou seja, um desastre social sempre prestes a acontecer. Foi preciso esbarrar acidentalmente num programa de TV para descobrir que essa minha característica não é uma espécie de falha de caráter, como eu imaginava, mas sim uma desordem neurológica.
Eu sabia há tempos que existe uma condição chamada prosopagnosia, palavra que, em grego, significa "incapacidade de reconhecer feições". Como a maioria das pessoas que sabem disso, porém, eu também achava que essa condição só dizia respeito a casos extremos, em que pessoas deixam de reconhecer até os parentes mais chegados, em geral devido a traumas ou cirurgias. É que só muito recentemente a medicina passou a identificar o problema também em pessoas que nasceram assim, e isso ainda não foi muito divulgado.
Vou morrer me sentindo um pouco menos culpada em relação à humanidade graças ao "60 minutes" que, no domingo passado, se dedicou ao assunto. Foi um momento de revelação. Fiquei sabendo que a prosopagnosia afeta, em diversos graus, cerca de 2% da população mundial, e que não foi identificada antes porque, afinal, ninguém se queixa ao médico de que não reconhece as pessoas. Nascemos assim e vamos vivendo, pronto. Oliver Sacks não tinha certeza de que era a si mesmo que se via no espelho; Jane Goodall, que sabe distinguir cada chimpanzé da Tanzânia, tem a maior dificuldade com gente.
Achei o programa incrivelmente reconfortante. Pela primeira vez vi a história da minha vida sendo contada por outras pessoas, da angústia de não reconhecer amigos, colegas de trabalho e vizinhos à dificuldade de acompanhar o enredo de alguns filmes ou novelas por não conseguir identificar as personagens. Percebi ainda que as duas histórias com que abri essa coluna, longe de serem as anedotas particulares que eu imaginava, são verdadeiros clássicos da prosopagnosia: os amigos na praia, que não reconheci porque estavam fora dos ambientes em que costumava encontrá-los, o moço associado à camisa.
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Não estou entre os casos mais severos; há gente que tem dificuldade em reconhecer pais, filhos, irmãos. Depois de assistir ao programa corri para a internet, onde li uma quantidade de artigos e acabei fazendo alguns testes. Um deles, criado com rostos de celebridades pelos centros de pesquisa sobre prosopagnosia do Dartmouth College, da Universidade de Harvard e do University College de Londres (faceblind.org), situa a margem de acerto de quem o faz em relação ao resto das pessoas. Dos 30 rostos que me foram apresentados, acertei 11, ou seja, 37%; o resultado normal está em 85%.
Reconheci Gandhi, Kennedy e Cher; não reconheci Brad Pitt, Madonna, Tom Cruise e, imaginem, Paul McCartney.
Não sei o que me faz reconhecer algumas pessoas e outras não; só sei que o reconhecimento não tem nenhuma ligação com os meus sentimentos. Reconheço pessoas por quem não sinto nada, e frequentemente não reconheço gente de quem gosto muito. Acho George Clooney uma maravilha da natureza, mas só consigo identificá-lo nas propagandas de café, e ainda assim por causa das xícaras e do logotipo da empresa.
Sobrevivo a uma vida social mais ou menos ativa porque criei uma série de mecanismos de defesa. Cumprimento amigos e desconhecidos com a mesma afabilidade, o que já me causou a amargura de saudar uma ou duas pessoas a quem, em pleno juízo, jamais daria bom dia; e, nas festas, me oriento pelas conversas, pela linguagem corporal e pelas roupas para saber com quem estou falando. Mesmo assim tenho certeza de que, para muita gente, sou a antipatia em pessoa, uma criatura de lua que ou passa batido ou diz "Muito prazer!" a amigos de décadas.
Ainda não há cura para a prosopagnosia. E, muitas vezes, nem para os mal entendidos que ela causa".
(O Globo, Segundo Caderno, 4.3.2016)


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