Então chegou o sábado e lá fui eu pra Meudon. Peguei o trem em Montparnasse e 16 minutos depois tava lá. Enquanto isso passamos por umas 3 cidades.
Segundo um amigo, eles colocam nome de cidade em qualquer povoado, pra parecer que tem muitas. Ô maldade!
Mas a verdade é que todo francês adora dizer que não mora em Paris. Morar em Meudon, por exemplo, é chic pra cacete. Eu prefiro o tititi de Republique. Esse silêncio que eles adoram, eu tô fora! Passarinho e grilo cantando? Nem morta!
Meu futuro patrão me esperava na estação. Segundo eles me contaram tempos mais tarde, ele e a patroa tinham tirado o sábado pra conversar com todas as moças que tinham telefonado e se interessado pelo trabalho. Essa era a segunda viagem que ele fazia.
Subimos por uma avenida - que depois virou o caminho da roça pra mim - e foi lá que o Seu Wagner morou com a esposa, Dona Minna Wagner.
Sempre que passava na porta da casa linda, de pedra, na avenida tranquila, ficava imaginando o compositor debulhando seu piano, dia e noite, e a vizinhança já com o saco na lua pensando: " Quando esse mané vai se mudar daqui e nos deixar em paz!"
Chegamos ao apartamento e começamos a conversar. Até então, tava em português e fui ficando sem graça, porque a patroa ficava só me olhando, então perguntei se não era melhor tentarmos falar em francês pra ela participar. Ela disse que não precisava, que tava adorando o som da nossa prosa. Então tá !
Falei de toda minha inexperiência em ser babá, nunca tinha sido, não tinha filhos, mas tinha quatro sobrinhas e trocentos amigos cheios de crianças que eu tava sempre carregando pra cima e pra baixo. Não fiquei muito tempo.
Ele olhou no relógio, porque já devia de ter outra candidata esperando na estação de trem, me levou embora, já aproveitando pra carregar a outra.
Disseram que era pra eu ligar na próxima quarta-feira pra ter uma resposta.
OK. Fui-me embora. Voltei pra capital.
Tempos mais tarde ele me contou que, quando voltou pra casa, a mulher dele disse: "É essa. Já escolhi". E ele: "Como assim, já escolheu? Você nem viu as outras, tem uma na sala esperando e mais não sei quantas pra chegar..." "Já escolhi", ela falou.
E nem na sala ela voltou mais. O pobre coitado passou a tarde de sábado falando em vão com moças esperançosas, sem poder já dispensar de cara porque não seria polido.
E eu já comecei a trabalhar na semana seguinte, na quinta-feira.
Cuidei do meu pequetito, que hoje já tem 21 anos, por alguns anos. Tempos depois, eu tava morando em NY, quando eles me acharam lá e me fizeram largar meus trabalhos e voltar pra Meudon pra cuidar da irmãzinha que ia nascer. Lá fui eu e fiquei mais uns anos.
Mas, como sempre, essa já é outra história.
Ah! Essas crianças são bisnetas da polonesa.
As fotos são da casa azul de Wagner, recentemente restaurada, a avenida arborizada onde fica a casa, casarão rosa, atual Museu Rodin em Meudon e mais fotos antigas da cidade.
" E assim chegar e partir. São só dois lados da mesma viagem. O trem que chega é o mesmo trem da partida." Milton e Brant