Na quarta semana, vi que não dava pra continuar.
Impossível pra mim, conviver com gente tão diferente. Tudo bem, era só um trabalho mas acabava sendo uma convivência e, chega uma hora, que você pensa: "Peraí, eu trabalho pra ganhar uma grana e ser o mais feliz possível e aqui só tá rolando a grana".
Não ia começar a frequentar uma Igreja Evangélica só por falta de opção. Seria, não só injusto, como meu saco explodiria no segundo culto. Um, tudo bem, segurei a onda, mais que um, é pedir muito. Como diz minha amiga francesa: "Já vi horrores suficientes na guerra".
Não ia começar a frequentar uma Igreja Evangélica só por falta de opção. Seria, não só injusto, como meu saco explodiria no segundo culto. Um, tudo bem, segurei a onda, mais que um, é pedir muito. Como diz minha amiga francesa: "Já vi horrores suficientes na guerra".
E como falar com a dona patroa que tava cascando no serrado?
Porque, pro empregador, você tá pegando o boi com chifre e tudo.
Casa tranquila, ela na rua o tempo todo, não me enchia o saco, ar-refrigerado, podia comer o que quisesse e quanto quisesse, cama no meio do quarto, sem medo ou perigo de acionar o alarme... Mas, e eu? E a conversa que gosto tanto ? E os amigos? E sair na rua, ver pessoas, ajudar uma pessoa idosa a atravessar o sinal, fazer compras no supermercado, discutir com o cara que vende o peixe, se abrigar embaixo de uma marquise esperando a chuvar passar, reclamar que as verduras ou legumes esse ano tão pela hora da morte, parár na banca de jornais e ler todas as manchetes dos jornais e revistas e ficar sabendo, antes do autor, o final das novelas, parár pra ver crianças se divertindo num parque, brigar com o trocador do ônibus porque ele não te deu o troco certo, ser quase atropelada na rua por um filho da mãe que avançou o sinal, parár pra olhar uma vitrine cheia de coisas que não estou precisando em absoluto, encontrar casualmente com um amigo na rua e colocar os causus em dia, sair cedinho pra comprar um pão fresquinho pra tomar com café com leite e manteiga com sal, ao invés de manteiga de amendoim - Deus que me livre e guarde de tão ruim - que só não é pior do que mel? Enfim, viver, respirar e não ficar comprando tudo pelo telefone, com um mané que entrega, coloca tudo na despensa e, ainda, no lugar, pra você. Isso é vida? Pode ser que, pra muitos, seja, mas eu tô fora.
Conversei com a dona maria, disse que era tudo muito lindo naquele Shangrilá, naquela Ilha da Fantasia, mas ficar apagando e acendendo luz e endireitando vaso de planta não era meu sonho de vida. Nasci pra ralar, pra produzir, ver o fruto do que plantei, ajudar amigos, rir, aproveitar a vida.
Ela não achou graça nenhuma, não entendeu, ficou até meio brava, afinal, devia ter feito o seu máximo, até me buscar de Jaguar no aeroporto ela buscou e, eu, a ingrata, cuspindo no Jaguar que andei.
E, quase que me esqueço do melhor, sem maldade mas, que foi engraçado, lá isso foi! Tinha vários coqueiros no estacionamento e, ela, como entrava e saía toda hora, deixava o carro lá fora. Eu disse, eu avisei : "Uma hora vai cair um coco em cima desse felino". Dito e feito! Eita boca!
E não é que, tibum? Não caiu só um, caíram dois cocos, um deve ter empurrado o outro e fizeram um fundo interessante na cacunda da fera, parecia uma mulher com peito embutido. Mas não falei nada, tipo: "Bem que eu avisei!" Ela, nem aí. Aquele carro foi pra oficina e tirou um outro de, não sei onde - como eu disse, não cheguei a conhecer a propriedade toda. Além da falta de curiosidade, juntava com a falta de saco - e continuou o baile.
Peguei meu salário - que ela me entregou com a cara emburrada - a minha amiga dominicana me deu uma carona e fui, linda, loira e feliz pro aeroporto; não de Jaguar, mas numa daquelas banheiras americanas, enormes, rabo de peixe, que pobre adora comprar assim que chega no Eldorado do Obama.
Deixei pra trás a pobre menina rica, que - imagino - hoje deve estar dando trabalho prum analista.
Voltei pra NY toda feliz. Pro meio da confusão. Que adoro !
E quem quiser que conte outra.