Cadê meu companheiro que apareceu em minha vida quando eu era, sem nenhum exagero, o mais solitário que já havia sido?
Cadê meu amigo que entrou na minha vida como uma esperança, uma lição, um ensinamento e uma esperança de futuro?
Um cão aleijado. Ele nunca se deu bem com carros e motos. Nasceu em uma casa com todo o conforto. Foi posto para viver na rua quando a dona que o pegou filhote, morreu. E sobreviveu, com dois anos de vida, ao desafio de ser – agora – um cão de rua.
Duas vezes atropelado. Por um carro e por uma moto. Coberto de feridas foi “adotado” por seres humanos plenos de grandeza, donos de em mercadinho, que o acolheram (mesmo que do lado de fora) trataram e o alimentaram.
E eu o descobri por uma reportagem do Estado de Minas informando do infortúnio dele. Dezenas de adotantes apareceram no O Lobo Alfa.
Mas ele era meu. Ou melhor, eu era dele.
Ainda triste por mais um atropelamento e abandono, o conheci triste e cansado. Mas foi absolutamente passageiro! No mesmo dia em que convenci ao amigo Crispim que ele ERA MEU (sem saber que na verdade eu sempre fui dele), já estava alegre e pronto para reiniciar mais uma etapa da vida. Uma amiga me levou até lá (na época estava sem carro) e adotei o Pepê.
Foram quatro anos maravilhosos! O Pepê ainda no apartamento, me ensinando que a vida recomeça. Que a alegria vence o desânimo. Sendo o cara que me ouvia, entendia (mesmo em silêncio, mas observado cada palavra como se entendesse!) e me acarinhando!
Defendendo-me de assaltos. Quando vim para cá morar em uma mata, poucos sabem, mas Pepê foi fundamental para esta escolha.
E aqui, desde o primeiro dia (quando pulou na piscina sem saber que esta nova piscina era muito maior que a piscina do apartamento, que ele usava e abusava!), foi o dono da casa! (só voltou à piscina no meu colo, quando a Maya do Thiago mostrou que era bom! Mesmo assim, no colo!).
Quando estive em hospitais, estava o tempo todo à espera. Sempre o primeiro a me receber.
NUNCA se importou em dividir o espaço e carinho meu com outros lobos. Sejam os que vieram e ficaram, sejam os que me visitavam, como a Maya e os cães do condomínio que brincavam com ele aqui em casa.
Amado pelos jardineiros! Não sei por que, amava jardinagem. Acompanhava atentamente, pulando e fazendo carinho, nos jardineiros aqui de casa, da rua e até dos vizinhos.
Recebia visitas com a cara mais alegre e os carinhos mais explícitos possíveis. Adorava idosos. Os acompanhavam pelo condomínio em troca de um afago na cabeça.
Era especial.
Cadê o falso vigia que ficava no muro de minha casa, latindo para quem passava e indo correndo, abanando o rabo, se estes passantes dessem a menor chance de contato? E passavam a ser os amigos (mais uns) do vigia que não vigiava: tentava ser amigo!
Assim, aqui na rua, são muitos os que passavam e sabiam que um mestiço de cooker com sabe-se lá o que, iria acompanha-los, lamber as mãos, fazer “gracinhas” e JAMAIS ser agressivo.
Mancava. Por vezes, muito. A dor dos atropelamentos anteriores cobrava o preço. E tomava o comprimido sem precisar sequer estar “embrulhado” em qualquer coisa que o enganasse. Ele sabia o que era e já sabia que fazia bem!
Aceitava os novos companheiros (ou antigos, como o amigo das ruas, o Hulck) sem sentir ciúmes ou disputar espaços. Sabia-se o preferido e não rejeitava os outros: antes, o acolhiam.
Deixou de ser o cão que vivia dentro de casa – com a chegada do Boninho – sem demonstrar rancor ou dor. Aceitou e continuava feliz. (Bono é um spitz alemão muito pequeno e a convivência entre ambos poderia ser perigosa. Embora eu soubesse que jamais seria, tive que optar: ou Pepê seria mais um da matilha de 4 do lado de fora (com os companheiros de rua) ou seria um cão de companhia! Ela não havia nascido para isto).
Teve mais de 12 filhotes no condomínio (todos adotados) até ser castrado. E continuava namorador! Sempre foi.
Manco, corria mais que os outros! Uma vez me chamou para libertar o Hulck (que é o Lobo Alfa) de uma casa em um bairro ao lado do condomínio. Me levou até lá!
Quando eu ficava mais triste, soltava os cães à noite. Eles (os outros) saiam e voltavam. Pepe ficava com a cabeça no meu colo, no banquinho do jardim, até que eu melhorasse.
Cadê Pepê? Está ali, em frente a minha janela. NA terra, que sempre cavava para se refrescar.
Mas não late mais. Não coloca a cabeça na janela para receber o afago e ir brincar. Não irá mais pedir a carne do churrasco. Não irá mais latir para a rua, como se fosse o guardião que nunca quis guardar nada: só alegrar quem passava pela rua.
Cadê o lobo que tomou uma facada aqui no condomínio e sobreviveu? Que em uma semana já estava, de novo, nos jardins e pracinhas do pedaço? O caroneiro que pegava carona com o Thiago?
Este condomínio, para mim, está mais triste. Lua não para de ganir/chorar.
Hulck, em pleno dia, está por si mesmo no canil.
Lourinho está deitado no mesmo lugar onde Pepê ficava vigiando a rua.
E eu estou sem lugar como se fosse um cara sem rumo, criança de 55 anos, idiota para quem não sabe o que é amar estes peludos e com uma saudade que é maior – que se haja um Deus, que me desculpe! – do que senti de alguns humanos.
Pepê, não tava combinado! Eu iria antes. E você já tinha até com quem ficar!
Um beijo pra você meu querido amigo Rey
bjos Pepê
Texto escrito pelo meu querido amigo Reynaldo, agora à tarde, depois de enterrar o seu cão, seu amigo, seu filho, seu companheiro de luta