Dia difícil. Muito difícil. Enterrar uma amiga não é fácil.
Mesmo sabendo que esta amiga se livrou de meses de muito sofrimento, de muita dor.
Ninguém nunca quer morrer. Na minha cabeça é o medo do desconhecido. Do que pode acontecer depois, se é que tem um depois.
Hoje, enquanto minha amiga estava sendo enterrada, não sei porque saí de perto da sepultura e fui andando mais pra longe um pouco. Do nada.
E os dois senhores que haviam colocado o caixão na sepultura estavam esperando dois amigos terminarem seu trabalho.
Semblantes sem expressão. Calados, quietos, como manda a regra de comportamento de quem não tem nada a ver com o que aconteceu e tá ali só fazendo seu trabalho. Então falei com um deles.
- Trabalho pesado, difícil, este o que vocês fazem.
E começamos uma conversa.
Um deles já trabalha há 20 anos neste cemitério e o outro há 5 anos.
Falamos sobre a dificuldade de trabalhar em um lugar onde não cruzam com pessoas felizes, rindo, contando sobre seu dia a dia. Falamos da dificuldade em não poder chegar em casa e comentar sobre o dia de trabalho como faz a maioria das pessoas. Dizer que o chefe encheu o saco, contar de um trabalho que foi legal, dos risos quando alguem caiu da cadeira, não importa. Qualquer coisa que acontece em um dia de trabalho em qualquer parte.
Como comentar com a mulher e os filhos, ou com os pais, numa mesa de jantar que hoje tem um enterro interessante. Interessante, triste, difícil. Isso não é um assunto que é bem vindo em mesa alguma.
Falamos da dificuldade em enterrar crianças. Eles me disseram que quase sempre choram junto com a família.
Hoje mesmo, disse um deles, enterramos uma mãe muito jovem e duas crianças assistindo e acompanhando e talvez não tendo ideia que estavam se despedindo dela pra sempre.
Barra muito pesada. Foi duro. A gente não se acostuma com isso.
E no meio da conversa me veio uma pergunta.
Vocês por acaso tem algum tipo de acompanhamento? Alguem conversa com vocês, dá algum tipo de apoio, orientaçao, como um psicólogo, por exemplo.
Não. Não temos nada.
E continuamos a conversa, discutindo sobre o tanto que poderia ajudar ter uma pessoa pra conversar pelo menos umas duas vezes por mês, pra orientar, dar suporte, ensinar a se protegerem.
Então sugeri que eles levassem essa ideia à diretoria do cemitério. Que conversassem, explicassem e sugerissem este apoio.
Me prontifiquei a ajudar. A apoiar.
Mais foi falado e mais foi discutido, e talvez, de uma conversa que começou com uma simples observação tenha saído uma ideia legal que possa ajudar estes homens.
Só sei, que descendo a colina atrás deles em direção à saída, e ouvindo a conversa dos dois, me deu um certo alívio. Era boa, otimista. Tomara que levem a ideia à frente e consigam ser compreendidos pela direção da casa. E que o apoio venha.
Voltando ao título desde post, esperei o uber me pegar ainda dentro do cemitério, perto à porta de entrada, e quado entrei no carro o motorista me cumprimentou e perguntou.
- Enterro?
Realmente, cemitério é um lugar onde perdemos as palavras. Não sabemos o que dizer e tudo que dizemos é muito pouco ou fica fora de propósito.
Respondi que sim e fomos calados até minha casa.