
Sexta-feira é o domingo dos muçulmanos.
Pra nós, que trabalhávamos em média 10 horas por dia, 6 dias por semana, era o dia de ficar na horizontal recolocando os ossos em ordem.
Se tivéssemos muito animados, íamos até Rabania - uma cidade turística feita pelos franceses, com um lago artificial enorme - alugavamos um bangalô e era bem legal também.
Entre outras coisas que se tinha pra fazer em pleno deserto, no único dia livre da semana, era dar uma faxina no quarto. Durante toda a semana a gente nem ligava pra confusão que ia armazenando.
Numa sexta- feira, resolvemos, minha amiga e eu que dividíamos o quarto, dormir até mais tarde e depois partir pra faxina.
E foi o que aconteceu.
Depois de terminada a peleja, eu fui tomar meu banho e ela foi colocar o lixo lá fora, num tamborzão que tinha do lado da casa.
No que ela tá lá, despejando o lixo, sentiu uma presença atrás dela. Virou e viu um soldado iraquiano, armado de metralhadora, com uma cara de médios amigos. Ela olhou pro prédio mais longe, onde era o clube, e viu uma movimentação, bandeiras, e deduziu que tínhamos visita de alguma ôtoridade local. Não era comum soldados no acampamento. Tínhamos nossa própria segurança.
Mais tarde, soubemos que o governador de Ramadi nos visitava, por isso tinha tanto soldado espalhado no nosso território.
Ele perguntou o que ela tava fazendo, "Como assim, não tá vendo? Despejando o lixo." Ele não entendeu o que ela tava fazendo ali, naquele local. "Ora bolas, eu moro aqui, seu mané." Ele também não entendeu. Ela desistiu de explicar e foi voltando pra dentro de casa e o soldado com a metralhadora em punho atrás dela.
Pode uma cena mais bizarra? Você sair pra despejar um simples lixo e uma figura querer saber quem você é, de onde vem e pra onde vai, diga a senha.... tenha dó.
Pois pode.
E não é que o zé veio seguindo ela até o quarto?
Ela abriu a porta e ele veio na cola. No que entrou no quarto, tô lá, eu linda e loira, pelada, recém saída do banho. Não me lembro mas, no mínimo, devo ter falado: "Cliente novo?"
O cara ficou lá, estatelado, parado, olhando pra mim e eu, pelada tava, pelada continuei. Ele não se movia, não sei se o espanto era porque via uma mulher pelada pela primeira vez, nos seus 20 e tantos anos de vida, ou porque não imaginou que fosse ser tão ruim sua primeira experiência. Sei lá. Só sei que grudou o olho em mim e eu fiz aquilo que sempre faço numa hora dessas. Sem pensar, tive uma reação fora da lógica: juntei as pernas e fiz continência pro moço. Afinal, era um soldado, de qualquer forma, meu superior, já que eu não era nada além de ser povo.
Foi o que faltava pro moço reagir. Reconheceu o sinal e bateu em retirada.
À noite, sentadas no bar tomando alguma coisa, avistamos o soldado sentadinho num canto, olhando ainda, mas desta vez, vermelhinho.
Nunca vou saber se era de prazer e alegria ou de ódio. Deve ter contado pros colegas e ninguém acreditou. Pedir pra repetir a cena, coragem ele não teria. Ver outra mulher nua, só casando e, mesmo assim, pelo buraquinho da camisola. Como a cena da manhã, nunca mais !
" Inicie a viagem como se fosse uma criança, curiosa e alegre; durante o trajeto desfrute como um adulto respeitoso e solidário; quando retornar, sinta-se como um ancião sábio que voltará a ser criança amanhã." Mercedes Sáenz